Essa é uma reprodução do Anuário do Leite 2022 da Embrapa. Por Samuel José de Magalhães Oliveira, Alziro Vasconcelos Carneiro, Paulo do Carmo Martins e Manuela Sampaio Lana.
Nos últimos 25 meses, a inflação do leite acumulou 60%, causando forte impacto nos custos de produção em toda a cadeia de lácteos, elevando-os de maneira desuniforme.
A Embrapa Gado de Leite calcula e divulga mensalmente a variação do custo de produção do leite de Minas Gerais, o mais importante estado produtor do país. É o ICPLeite/Embrapa, também conhecido por ‘inflação do leite’, que informa produtores, técnicos e demais agentes do negócio sobre a evolução dos custos da atividade.
No início de 2020, os índices mensais se mostravam comportados, por volta ou abaixo de 1% ao mês. Em maio de 2020, no início da pandemia do Covid-19, este valor foi até negativo, refletindo a forte retração econômica decorrente das medidas de isolamento social implantadas no Brasil e no mundo.
Tais medidas, assim como a distribuição de auxílio para expressiva parcela da população, tanto no Brasil como nos Estados Unidos e Europa, tiveram importante consequência nas cadeias produtivas do agronegócio e demais setores da economia.
Do lado da oferta, houve restrição à disponibilidade de bens e serviços, já que um menor número de pessoas e empresas trabalhou e produziu. Também houve repercussão na logística mundial, com aumento do frete marítimo, impactando produtos que dependem de transporte de longa distância, como insumos agrícolas e semicondutores, entre outros.
Do lado da demanda, pela maior disponibilidade de dinheiro em circulação a partir da disponibilização do auxílio emergencial, houve aumento da procura de bens e serviços de maneira mais rápida que o previsto por muitos agentes econômicos. De fato, já no final de 2021, a demanda por muitos bens e serviços já se encontrava acima dos patamares pré-pandemia, observados no final de 2019 em diversas regiões do planeta.
CUSTOS DE PRODUÇÃO CONTINUARÃO DESAFIANDO GESTÃO E OFERTA DE LEITE
Este desequilíbrio provocado pelas ações de minimização dos efeitos econômicos da pandemia levou a um surto inflacionário em escala mundial. Já em janeiro de 2022, o Brasil, com o agravante da forte depreciação do real observada durante a pandemia, registrou inflação anual de 10%, patamar não observado desde 2015. A Europa viu a inflação anual suplantar os 5%. Os Estados Unidos sofrem o maior surto inflacionário em 40 anos, com taxa anual já rondando os 8%.
Para o produtor de leite, esse surto inflacionário já se revelava no segundo semestre de 2020, quando a taxa mensal alcançou 5,7%. A partir de então, houve forte oscilação mensal dos indicadores, alcançando apenas 0,3% em julho de 2021, mas fechando janeiro de 2022 com 2,4%.
O cômputo da inflação acumulada em 12 meses apresentou também forte oscilação no período. Registrou de 4% a 7% entre janeiro e julho de 2020. A partir daí apresentou forte aceleração, alcançando 40% em agosto de 2021 e declinou alcançando 25% em dezembro de 2021 e em janeiro de 2022.
Entre janeiro de 2020 e janeiro de 2022, a inflação do leite acumulou 60%, o que causou forte impacto nos custos de produção em toda a cadeia de lácteos. Este aumento deu-se de maneira desuniforme entre os diferentes componentes do custo. Bens e serviços menos ligados ao comércio externo, como sanidade e reprodução, mão de obra e qualidade do leite, exibiram menor variação, inferior a 20% acumulados nos 25 meses do período.
Por outro lado, volumosos e concentrados, muito influenciados pelos preços de commodities com preços formados no mercado internacional, como soja e milho, apresentaram aumentos mais expressivos, acima de 80%.
A produção leiteira enfrentou dificuldades relacionadas ao custo de produção do leite nos últimos 25 meses. Apesar de a inflação do leite parecer ter arrefecido ultimamente, ainda está acima de 20% ao ano, valor significativo. Isso mostra que os problemas relacionados ao custo de produção de leite ainda podem continuar desafiando a gestão da propriedade rural e a oferta de lácteos no país por mais algum tempo.
Samuel José de Magalhães Oliveira e Paulo do Carmo Martins, pesquisadores; Alziro Vasconcelos Carneiro e Manuela Sampaio Lana, analistas. Todos da Embrapa Gado de Leite, de Juiz de Fora-MG.